Maurício Viana Bernardino, Labchecap
Ao assumir os laboratórios Labchecap em 2006, após a morte do pai, Ananias Bernardino – um dos sócios fundadores da empresa – Maurício Viana Bernardino herdou a responsabilidade de administrar um negócio com 4 unidades e faturamento anual de R$ 5 milhões. Em sete anos, a empresa cresceu, em média, 38% ao ano. Neste ano, tem previsão de fechar com faturamento de mais de R$ 70 milhões. Outra meta é a diversificação de serviços, com a criação de uma clínica de diagnóstico por imagem, a Labchecap Imagem, ainda em construção. Na continuação da série de entrevista com grandes empresários baianos, o diretor-executivo do Labchecap fala sobre a estratégia de crescimento da empresa, dos desafios do setor de laboratórios e das negociações com os planos de saúde, um dos principais problemas do setor.
A que o senhor atribui a alta taxa de crescimento do Labchecap, uma média de 38% ao ano, nos últimos sete anos?
Foco, conservadorismo financeiro e muita disciplina. Em outras palavras: a gente brinca que a empresa é rica e o sócio é pobre. A gente usa o dinheiro da empresa para o seu próprio crescimento. A gente tem um pro-labore para cobrir o nosso custo e deixa 90% da geração de caixa na própria empresa. O primeiro ponto é esse. Segundo: a gente não sai inventando moda. Temos um modelo de trabalho e a gente replica ele. Não vou de laboratório a construtora. A gente é laboratório e a gente abre unidades nesta área. Além de disciplina e persistência, é uma vontade de continuar crescendo. Claro que com muito conservadorismo. Eu poderia crescer a uma taxa acima de 30%, só que a gente procura crescer numa taxa que não quebre a empresa em termos de processos e pessoas. Se você cresce muito rápido, manter qualidade é difícil. Manter a equipe num clima legal é difícil. Manter as contas é difícil porque requer novos investimentos. A gente é uma empresa com uma alavancagem baixíssima, quase sem dívidas.
A perda do seu pai, que administrava a empresa, foi trágica e repentina. Ananias Bernardino foi a única vítima de um acidente de catamarã na Baía de Todos os Santos, em dezembro de 2006. Que desafios o senhor enfrentou ao assumir os negócios e como conseguiu superá-los?
Tive a ajuda de Deus. A gente teve a questão sucessória natural dentro da família, um processo de inventário e decisões sobre patrimônio. Isso foi um processo difícil internamente e a gente teve que lidar, mas deu tudo certo. Teve o desafio próprio da minha competência, que foi posta à prova de uma hora para outra. Antes nós tínhamos um interlocutor, que era o fundador da empresa junto com os outros sócios. Meu sócio hoje, Josemar Fonseca, que era o sócio do meu pai, é o diretor técnico da empresa. Ele tem um foco muito técnico, uma pessoa competentíssima. A figura do empresário caiu sobre os meus ombros. Construir essa competência foi um grande desafio. Foi pedindo ajuda, conversando com pessoas, ouvindo professores para dar um rumo para a empresa. O setor ajudou também. O setor de saúde é um segmento com uma demanda crescente. Então, a gente acabou surfando nesta onda. A quantidade de usuários de planos de saúde no país vem aumentando ao longo dos anos. É um mercado que quase dobrou de tamanho nos últimos anos. Em 11 anos, o mercado aumentou quase 76%. Isso, naturalmente, gerou demanda para as empresas. Junto com isso você tem o aumento dos exames, a vontade das pessoas de cuidar mais da saúde. Acabou que a gente aproveitou o momento bom da economia no setor da saúde para crescer um pouco mais.
A sua formação é de farmacêutico bioquímico, como profissionais de saúde se tornam bons gestores?
É uma mistura de vontade de liderar e fazer algo diferente com aprendizado técnico. Não acho que o fato de eu ser um bom gestor em laboratório me faz ser um bom gestor em negócios. Acho que você tem que ter competências focais no negócio em que atua. Estou aqui em uma posição que eu lidero uma equipe, minha responsabilidade é com essa equipe, com esse público consumidor, com os meus pacientes e com os meus sócios. Então, é isso, a mistura da vontade de servir e empreender com a formação técnica e com o conhecimento do setor.
Muitos diferenciam a administração de uma empresa familiar, como o Labchecap, da gestão de outras empresas. Como o grupo lida com as relações familiares nos negócios?
A gente chegou em uma equação muito boa. A gente tem um conselho de sócios que são duas famílias, a minha família e a família de meu sócio. Lá dentro a gente decide questões do conselho de sócios. E temos a figura dos administradores. Eles têm autonomia para trabalhar e se respeitam muito. Existem membros da família na gestão, existem. Mas a gente define claramente os papéis e trabalha com muito respeito e confiança. Na qualidade de executivo eu tento fazer o melhor. Eu não confundo os papéis de sócio, parente e executivo. Graças a Deus a gente conseguiu separar bem esses papéis. Claro que dentro de uma política de indicadores e resultados e qualidade que rege a companhia.
Qual a estratégia empresarial que levou o Labchecap a investir no setor de diagnóstico por imagem?
O que acontece atualmente é que o cliente que vai fazer exames de imagem e exames de laboratório é o mesmo cliente, em momentos muitos semelhantes. Hoje no mercado existe uma rede de prestadores que nem sempre consegue marcar tudo junto. A nossa proposta é integrar os setores e oferecer uma proposta para o paciente para que ele possa fazer tudo junto, com comodidade, com hora marcada, com resultados na internet, de preferência integrado com o consultório médico. O nosso negócio aqui é prover informações de saúde. Então, a nossa ideia é criar uma sinergia para o paciente fazer tudo junto com o mesmo nível de qualidade, de segurança, com unidades confortáveis e boa distribuição pela cidade.
Médicos, laboratórios, hospitais e clínicas vivem atualmente disputas com os planos de saúde, como é o caso recente da paralisação de profissionais credenciados ao Bradesco Saúde. Como esses conflitos prejudicam o mercado e o consumidor brasileiro?
É um cobertor curto. É a frase que a gente usa. São recursos limitados. Existe uma capacidade de pagamento do consumidor limitada. Existe uma receita do plano limitada. E existe uma defasagem de pagamento dos profissionais e prestadores de serviço. Você tem o setor faturando muito, mas com a margem super-apertada batendo muito próximo da receita. Eles (os planos) também não estão muito bem. Como resolver isso? Precisa-se restruturar o setor, aplicar técnicas de gestão, verificar se existe ineficiência no setor para melhorar. Mas o plano também está com problema, o usuário paga caro. Então, como é que resolve tudo isso? É um trabalho muito grande e muito complexo porque tem muitos interesses envolvidos.
Para o setor de prestação de serviços de laboratório, em quanto está a defasagem de remuneração dos planos de saúde?
Diria que a gente deve estar com 20 anos sem reajuste. A gente teve algumas tabelas novas que mudaram, algumas remunerações, incluíram alguns procedimentos, mas se você pegar os exames de rotina, ele estão, nos últimos 20 anos, praticamente com o mesmo preço. Precisaria reajustar 100%. Um hemograma custa R$ 8, uma glicose, R$ 4. Se você chegar com uma requisição médica para fazer o hemograma, você vai ser atendido por um manobrista, por um recepcionista, por um atendente, vão tirar seu sangue, vai tomar café depois, tudo por R$ 8. Como a gente faz? A gente trabalha em escala. São 500 mil exames por mês. É um volume enorme. A gente trabalha com eficiência, com produtividade, com processo, com automação, para poder conseguir . Algumas áreas conseguem melhorar porque são mais influentes e fazem uma pressão maior, mas nós laboratórios estamos com bastante dificuldade neste quesito para reajuste de preços
Como a desafasagem pode prejudicar o consumidor a longo prazo?
No setor de saúde como um todo, a gente observa que a fonte pagadora começa a criar mecanismos de controle de seus custos e começa a requerer uma série de autorizações. Isso eventualmente pode atrasar uma cirurgia, um procedimento e não autorizar um exame. Mas eu acredito que o setor vai se organizar. Não acho que o consumidor final será prejudicado. A regulação do setor é muito forte, não acho que vá perder qualidade na prestação de saúde. Existem elementos que regulam. Então o consumidor terá dificuldade em acessar o serviço, mas ele não perde qualidade. A Bahia tem excelentes profissionais em todas as áreas. Vai perder no acesso, por conta das barreiras burocráticas que podem ser criadas.
Em relação a acesso, os planos podem ficar mais caros?
Podem. É uma tendência natural ficar mais caro.
Quais são os principais desafios que o setor de laboratórios tem atualmente?
O principal desafio nosso é conseguir mediar a relação com a fonte pagadora, que são os planos de saúde. Esse é um desafio grande. Você conseguir chegar em uma equação que você consiga recompor seus custos e que ele entenda que isso é importante. A gente vem sofrendo esa pressão com efeito negativo de margem. Outro ponto é desenvolver lideranças. Esse processo de expansão muito rápida não dará certo se a gente não tiver boas liderança que vão tocar as unidades de atendimento que estarão espalhadas pela Bahia e onde mais a gente quiser ingressar.
Quais são as próximas metas da empresa? Onde o senhor acha que o Lachchecap pode chegar?
Eu só tenho 33 anos, então eu quero trabalhar até a minha morte. Tem muito chão pela frente. O Labchecap quer consolidar a sua presença em Salvador. Depois vamos fazer uma expansão de até 200 quilômetros. A gente consolida e expande. A gente não sai para outro mercado sem ter consolidado o mercado em que a gente atua. A gente vai para cidades do interior a partir do ano que vem. Já selecionamos cidades com maior potencial de crescimento. Estamos indo para Camaçari. Na rede existente também queremos colocar mais serviços nas unidades. Depois que olharmos o Estado, vamos passar a olhar a região Nordeste.